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Língua mirandesa

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Mirandês

Mirandés

Falado(a) em: Portugal
Região: concelhos de Miranda do Douro e Vimioso
Total de falantes: c. 8 500 (2023)
Família: Indo-europeia
 Itálica
  Românica
   Ítalo-ocidental
    Românica ocidental
     Galo-ibérica
      Ibero-românica
       Ibero-ocidental
        Asturo-leonês
         Mirandês
Escrita: Alfabeto latino
Estatuto oficial
Língua oficial de: Língua cooficial em Miranda do Douro (Portugal)[1]
Regulado por: Instituto da Língua Mirandesa (Anstituto de la Lhéngua/Léngua Mirandesa)
Códigos de língua
ISO 639-1: --
ISO 639-2: mwl
ISO 639-3: mwl
Placa de informação, na Igreja de Miranda do Douro, com o texto em mirandês
Placa de identificação de arruamento, em Genísio, com o nome da rua em mirandês e em português

A língua mirandesa (lhéngua/léngua mirandesa, mirandés) é o nome oficial que recebe o asturo-leonês em território português. Um estudo da Universidade de Vigo revelou que em março de 2020 a língua era conhecida de cerca de 3500 pessoas, das quais cerca de 1500 são capazes de a falar regularmente.[2] Os falantes distribuem-se principalmente por uma área de 550 km²,[3] conhecida como Terra de Miranda[1] e formada pelo concelho de Miranda do Douro e freguesias de Angueira e Vilar Seco, no concelho de Vimioso.[4] A inclusão de Caçarelhos (atualmente parte da freguesia de Caçarelhos e Angueira) na área de domínio linguístico mirandês é defendida por autores como Amadeu Ferreira.[5]

O mirandês tem três subdialetos (central ou normal, setentrional ou raiano, meridional ou sendinês) e está dotado de um dicionário, gramática e ortografia próprios; os seus falantes são em maior parte bilíngues, trilíngues ou até mesmo quadrilíngues falando muitos deles o mirandês, o português e o castelhano, e até por vezes o galego.[carece de fontes?] As associações como a SIL International outorgam um código próprio à língua, enquanto que a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) a enquadra no contexto do asturo-leonês.[6]

Os textos recolhidos em mirandês mostram a envolvência de traços fonéticos, sintáticos ou vocabulares das diferentes línguas; o português é mais cantado pelos mirandeses, porque é considerado língua culta, fidalga, importante. Possui status de língua reconhecida em Portugal desde 1999.[7][8][9]

Situação atual

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Um estudo da Universidade de Vigo revelou que em março de 2020 existiam apenas 3500 pessoas que conhecem a língua, das quais apenas cerca de 1500 são capazes de a falar regularmente. Foi identificada uma ruptura com este idioma, em particular nas gerações mais novas, através de uma “forte portugalização linguística”, derivada sobretudo do efeito dos meios de comunicação social, e da associação do mirandês à ruralidade e à pobreza. Encontra-se em situação muito crítica, prevendo-se o seu desaparecimento em cerca de 20 anos se se mantiver o ritmo atual.[2]

O mirandês é, desde 1999, a segunda língua oficial do país. A preservação da língua mirandesa deve-se à geografia e ao isolamento das designadas Terras de Miranda. Os rios ou cordilheiras são fatores cruciais para a criação de uma "fronteira linguística". No caso das Terras de Miranda, o rio Sabor teve influência, isolando a área da influência da língua portuguesa. Outro factor para a preservação da língua é a proximidade e a acessibilidade a Espanha, tendo assim um comércio virado para o turismo espanhol, uma atividade crucial na cidade de Miranda do Douro. Esta cidade tem uma grande vertente comercial destinada aos espanhóis que outrora faziam parte do Reino de Leão, que muitas vezes ainda falam o asturiano, língua de origem do mirandês. Isto terá feito com que o mirandês chegasse aos nossos dias quase intacto, a acessibilidade e o contacto constante a uma Espanha que fala, essencialmente, o asturiano e um isolamento face ao português. Havia muitos anos que o mirandês não era falado no coração da comarca, Miranda do Douro, mas, nos últimos anos, a deslocação das pessoas das aldeias para a cidade trouxe o mirandês de volta, porque nas aldeias era onde se conservava o mirandês e este êxodo rural trouxe a língua mirandesa novamente à cidade. A língua mirandesa está numa situação de diglossia, isto é, quando duas línguas coexistem mas uma prevalece sobre a outra, por razões extralinguísticas. Neste caso o português tem conquistado os habitantes das Terras de Miranda pelo seu prestígio e difusão global. A atitude dos falantes em relação à sua língua autóctone também leva a uma relação de diglossia. Como exemplo, tem-se "Lição de Mirandês: You falo como bós i bós nun falais como you" de Manuela Barros Ferreira (do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa) em que é evidente a desvalorização da língua mirandesa face ao português. Segundo os entrevistados,[10] não falam o mirandês quando estão em situações formais, como por exemplo, na relação professor-aluno (como é o caso do entrevistado) é, de uma forma geral, a língua portuguesa que prevalece. Há também alguns complexos com a língua, reservando-a a contextos mais familiares, do quotidiano ou mesmo contextos de extrema intimidade. Todos estes fatores levam a língua a uma situação de diglossia.[11][10]

O ensino do mirandês, opcional nas escolas do concelho de Miranda do Douro, é limitado a uma hora por semana, não dispondo até hoje de livros de texto, materiais pedagógicos e vagas próprias de docentes especializados.[2]

Entre as possíveis medidas de proteção, contam-se a ratificação da Carta Europeia das Línguas Minoritárias, a criação de uma nova Lei do Mirandês, atualizada de acordo com as ações e medidas planeadas e orçamentadas em áreas como educação, justiça, administração local e regional, serviços públicos, meios de comunicação, atividades e equipamentos sociais, economia e intercâmbios transfronteiriços. Esta nova Lei do Mirandês serviria como ponto de partida para impulsionar o desenvolvimento dessas áreas e promover o uso e a preservação do Mirandês como uma língua minoritária e culturalmente significativa, possivelmente levando a que a língua mirandesa ganhasse nova vitalidade.[2]

Características comuns ao português, ao galego e ao asturo-leonês ocidental (origem linguística da língua mirandesa):

  • manutenção de f- inicial latino: filiu (latino) = filho (português);
  • evolução do grupo latino -ct- em -it-: nocte (latino) = noite (português);
  • evolução dos grupos latinos pl-, cl- e fl- em africada /tʃ/;
  • conservação dos ditongos ei e ou.

Algumas diferenças fonológicas em relação ao português:

  • palatização da consoante inicial l: língua = lhéngua/léngua (sendinês);
  • manutenção das consoantes l e n em posição intervocálica: lua = lhuna/luna (sendinês), mau = malo;
  • palatização das consoantes duplas ll/nn/mn: castelo = castielho, ano = anho, dano = danho;
  • ditongação da vogal breve e em posição tónica: ferro = fierro.

Amostras de texto

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Segue-se um texto amostra em língua mirandesa publicado no jornal Público por Amadeu Ferreira, a 24 de julho de 2007. Para comparação, apresentam-se as traduções do texto para leonês, asturiano, português, galego e castelhano.

Mirandês Mirandês (sendinês) Leonês Asturiano Português Galego Castelhano
Muitas lhénguas ténen proua de ls sous pergaminos antigos, de la lhiteratura screbida hai cientos d'anhos i de scritores hai muito afamados, hoije bandeiras dessas lhénguas. Mas outras hai que nun puoden tener proua de nada desso, cumo ye l causo de la lhéngua mirandesa. Muitas lénguas ténen proua de ls sous pergaminos antigos, de la literatura screbida hai cientos d'anhos i de scritores hai muito afamados, hoije bandeiras dessas lénguas. Mas outras hai que nun puoden tener proua de nada desso, cumo ye l causo de la léngua mirandesa. Muitas llinguas tienen arguyu los sous pergaminos antigos, de la lliteratura escrita hai cientos d'annos y d'escritores enforma famosos; guei bandeiras d'eisas llinguas. Peru hai outras que nun pueden tenere arguyu de res d'eisu, cumo ye'l casu de la llingua mirandesa. Munches llingües tienen arguyu de los sos pergaminos antiguos, de la lliteratura escrito hai cientos d'años y d'escritores perfamosos, anguaño banderes d'eses llingües. Pero hai otres que nun puen tener arguyu de nada d'eso, como ye'l casu de la llingua mirandesa. Muitas línguas têm orgulho dos seus pergaminhos antigos, da literatura escrita há centenas de anos e de escritores muito famosos, hoje bandeiras dessas línguas. Mas há outras que não podem ter orgulho de nada disso, como é o caso da língua mirandesa. Moitas linguas teñen orgullo dos seus pergamiños antigos, da literatura escrita hai centenares de anos e de escritores moi famosos, hoxe bandeiras desas linguas. Mais hai outras que non poden ter orgullo de nada diso, como é o caso da lingua mirandesa. Muchas lenguas tienen orgullo de sus antiguos pergaminos, de literatura escrita hace cientos de años y de escritores muy famosos, hoy banderas de esas lenguas. Pero hay otras que no pueden tener orgullo de nada de eso, como es el caso de la lengua mirandesa.

Excerto de “O Natal em Barroso (L Natal an Barroso)” por Bento da Cruz e traduzido para mirandês por Amadeu Ferreira (a versão em português apresentada não é a do original, pois foi ligeiramente rescrita para ser mais similar à tradução mirandesa).

Mirandês Português
Outra eideia que anda cumigo zde esse tiempo ye la de que las pessonas spertában todas bien çpuostas aquel die - nun sei se a spera de la salbaçon, se de l bacalhau i las torreijas. Seia cumo seia, anque l'eigreija nun lo mandasse, todos guardában die santo a 24 de dezembre. I até, por bias desso, se me stá a lhembrar dũa beç mie mai haber ounhido las bacas i me haber dezido[…] Outra ideia que anda comigo desde esse tempo é a de que as pessoas espertavam todas bem dispostas aquele dia - não sei se à espera da salvação, se do bacalhau e das rabanadas. Seja como seja, embora a igreja não o mandasse, todos guardavam o dia santo a 24 de dezembro. E até, por vias disso, estou a lembrar-me duma vez em que a minha mãe tinha jungido as vacas e me tinha dito[…]
Artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Localização Bloco linguístico Texto
Dialetos asturo-leoneses
Fala de Carreño Astúrias Central Tolos seres humanos nacen llibres y iguales en dignidá y drechos y, pola mor de la razón y la conciencia de so, han comportase fraternalmente los unos colos otros.[12]
Fala de Somiedo Astúrias Ocidental Tódolos seres humanos nacen ḷḷibres ya iguales en dignidá ya dreitos ya, dotaos cumo tán de razón ya conciencia, han portase fraternalmente los unos conos outros.[13]
Paḷḷuezu Leão Ocidental Tódolos seres humanos nacen ḷḷibres ya iguales en dignidá ya dreitos ya, dotaos cumo tán de razón ya conciencia, han portase fraternalmente los unos conos outros.[13]
Cabreirês Leão Ocidental Tódolos seres humanos ñacen llibres y iguales en dignidá y dreitos y, dotaos cumo están de razón y concéncia, han portase fraternalmente los unos pa coños outros.[14]
Mirandês Terra de Miranda Ocidental Todos ls/To ls seres houmanos nácen lhibres/libres i eiguales an denidade i an dreitos. Custuituídos de rezon i de cuncéncia, dében portar-se uns culs outros an sprito de armandade.[15]
Castelhano
Estremenho Estremadura Salamanca Falas de transição entre o asturo-leonês e o castelhano Tolos hombris nacin libris i egualis en digniá i derechus i, comu gastan razón i concéncia, ebin comportal-se comu hermanus los unus conos otrus.[16]
Montanhês ou cântabro Cantábria Tolos seris humanos nacin libris y eguales en dignidá y drechos y, dotaos comu están de razón y conciencia, tién de comportase comu hermanos los unos conos otros.[17]
Castelhano (norma padrão) Castela Castelhano Todos los seres humanos nacen libres e iguales en dignidad y derechos y, dotados como están de razón y conciencia, deben comportarse fraternalmente los unos con los otros.[18]
Galego-português
Português Portugal Português Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.[19]
Galego Galiza Galego Todos os seres humanos nacen libres e iguais en dignidade e dereitos e, dotados como están de razón e conciencia, débense comportar fraternalmente uns cos outros.[20]
Fala(Xalimego) Val de Xálima Fala Tolus seris humanus nacin libris i iguais en dignidai i dereitus i, dotadus comu están de radón i conciencia, debinse comportal fratelnalmente uns cun us oitrus.

Referências

  1. a b «Lei n.o 7/99 de 29 de janeiro: Reconhecimento oficial de direitos linguísticos da comunidade mirandesa» (PDF). Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Diário da República (24): 574. 29 de janeiro de 1999 
  2. a b c d «Visão | Mirandês em situação "muito crítica" devido ao abandono das entidades públicas». Visão. 21 de fevereiro de 2023. Consultado em 9 de maio de 2023 
  3. Gómez Bautista, Alberto (2016). «Contributo para uma história do asturo-leonês em Portugal» (PDF). Academia da Língua Asturiana. Lletres Asturianes (115): 89-102. ISSN 0212-0534. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  4. «Convenção Ortográfica da Língua Mirandesa» (PDF). Câmara Municipal de Miranda do Douro e Centro de Linguística da Universidade de Lisboa. 1999. Consultado em 14 de janeiro de 2019. Arquivado do original (PDF) em 29 de junho de 2003 
  5. Ferreira, Amadeu (2010). «O Mínimo sobre a Língua Mirandesa». Sendim: Sons da Terra. Revista do Festival Intercéltico (13): 61–63. Consultado em 14 de janeiro de 2019. A língua mirandesa é falada em todas as aldeias do concelho de Miranda do Douro, com exceção de duas (Atenor e Teixeira), e em três aldeias do concelho de Vimioso (Vilar Seco, Angueira e Caçarelhos), no distrito de Bragança. O mirandês foi, apressadamente, dado como extinto em aldeias como Caçarelhos, porém, apesar de muitíssimo debilitado, continua aí a ser falado por pessoas de idade. 
  6. «UNESCO Interactive Atlas of the World's Languages in Danger». Livro Vermelho das Línguas Ameaçadas (em inglês). Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  7. O mirandês é língua oficial de Portugal desde 1999. Que futuro tem?
  8. Mirandês ultrapassa isolamento e chega a segunda língua oficial em Portugal
  9. O mirandês, segunda língua oficial de Portugal desde há dez anos
  10. a b Ferreira, Manuela Barros (1999). «Lição de Mirandês: You falo como bós i bós nun falais como you». In: Francisco Fernández Rei; Antón Santamarina Fernández. Estudios de Sociolingüística Románica. Linguas e variedades minorizadas (em mirandês). Santiago de Compostela: Servizo de Publicacións da Universidade de Santiago de Compostela. p. 150 
  11. «Sítio de l Mirandés». Centro de Linguística da Universidade de Lisboa (em mirandês). Universidade de Lisboa. Consultado em 14 de janeiro de 2019. Arquivado do original em 16 de fevereiro de 2006 
  12. «Universal Declaration of Human Rights (Article 1)». Omniglot (em inglês). Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  13. a b González-Quevedo, Roberto (2001). La fala de Palacios del Sil (em asturiano). Oviedo: Academia da Língua Asturiana. ISBN 9788481682168. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  14. Lobato, María Concepción Casado (2002). El habla de La Cabrera Alta (em asturiano e espanhol). Oviedo: Academia da Língua Asturiana. p. 25. ISBN 9788481683271. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  15. Conde, Francisco Xavier Frías (2001). Notes de lingüística asturlleonesa: asturiano y mirandés (em asturiano). Gijón: VTP Editorial. ISBN 978-84-89880-48-1 
  16. García, Ismael Carmona (2002). «Morfología del extremeño» (em espanhol). Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  17. «Daque custiones alredor de la sintaxis del cántabru occidental» (PDF). Asociación ReDe. Alcuentros. Revista cántabra de lenguas minoritarias (em cântabro) (5). 2005. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  18. «La Declaración Universal de Derechos Humanos» (em espanhol). Organização das Nações Unidas. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  19. «Declaração Universal dos Direitos Humanos». Diário da República. Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Consultado em 14 de janeiro de 2019 
  20. «Declaración Universal dos Dereitos das Persoas». Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (em galego). Organização das Nações Unidas. Consultado em 14 de janeiro de 2019 


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