Ano passado eu comecei a escrever um conto fantástico sobre um pescador que lançou a sua rede sobre o por do sol. Inicialmente a ideia surgiu quando eu estava estudando sobre constelações e descobri que Carina, Puppis e Vela, faziam parte de uma mesma constelação de um barco, geralmente chamado de Argo.
Eu então imaginei uma história sobre um marinheiro que viajava em um barco feito de estrelas, vivendo diversas aventuras e encontrando tesouros fantásticos, como um peixe com escamas feitas de ouro que brilhavam como o sol, ou um peixe prateado como a lua. Eu gostei tanto de imaginar como seriam os elementos dessas histórias que eu fiz uma série de ilustrações para cada conto.
O primeiro conto é o Peixe dourado, eu pintei as escamas com tinta dourada:
O Peixe do pôr do sol
Havia um pescador muito pobre que vivia com sua esposa em uma cidade à beira mar. O pescador queria dar uma vida melhor para a sua esposa, mas sendo um mero pescador, essa sonho nunca deixaria de ser apenas isso, um sonho.
Um dia um grupo de marinheiros apareceu no cais, contando as mais absurdas histórias sobre suas viagens, navios fantasmas, sereias, até que um deles mencionou uma lenda que ninguém nunca havia ouvido antes.
"Estou dizendo, estávamos em alto mar e o vento parou de soprar, nenhum navio ou terra à vista, o azul nos cercava por todos os lados e permanecemos assim até o por do sol, foi quando um lampejo dourado, cruzou as águas como um raio, desaparecendo no leste, era um enorme peixe feito de ouro."
Aquela seria apenas mais uma ladainha de marinheiro bêbado, se seu avô, há muitos anos atrás não tivesse lhe contado essa mesma história " Quando o sol estiver no auge, vá para onde o mar e o céu se toquem em todas as pétalas da rosa dos ventos. Encarando o oeste, espere o poente e você irá ver um belíssimo peixe de escamas douradas e cauda de entardecer."
Em uma manhã ele aprontou sua rede mais forte, beijou sua esposa, e foi pescar.
Com o seu pequeno barco ele foi para o alto mar, e navegou até que já não fosse mais possível vislumbrar qualquer pedaço de terra no horizonte, ele estava cercado pelo puro azul do mar e do céu apenas com o sol acima dele.
Ele mirou o oeste, e esperou o poente, o dia passou e o sol caminhava pelo seu ardendo em sua pele, finalmente quando sua luz tingiu o azul de laranja, com a rede em suas costas, ele fitou o pôr do sol e no primeiro vislumbre do raio dourado na água, ele lançou a sua rede do outro lado do barco, que foi puxada com violência.
Uma figura dourada emergiu das águas, era um peixe gigantesco, suas escamas pareciam moedas de ouro cuidadosamente dispostas sobre seu corpo, sua cabeça emanava tanta luz que era quase impossível olhar diretamente para ele, e sua cauda, possuía as cores alaranjadas do poente que pintou o céu segundos antes.
O peixe se debateu deixando duas escamas douradas caírem dentro do barco antes de se soltar e desaparecer no horizonte deixando o pescador sozinho na escuridão da noite, iluminada somente pelas escamas que reluziam em ouro dentro do barco, e as estrelas que refletiam seu brilho mistico nas águas do mar.
O segundo conto se chama Argos e eu tive a ideia de fazer furos onde as estrelas ficariam, assim quando o desenho fosse colocado contra a luz, você poderia ver as estrelas Video
Argo Navis
Após conseguir duas escamas do lendário peixe de ouro, o pescador começou a remar de volta para casa, mas não importava o quanto ele remasse, o porto nunca surgia no horizonte. Ele havia se afastado tanto assim? Não era possível, o mar estava calmo naquele dia.
Cansado de tanto remar, ele adormeceu ali no barco, mas ao acordar diversas vezes ao longo da noite, ele percebeu que não importava quanto tempo passasse, a manhã nunca chegava.
Finalmente depois de muito tempo à deriva, ele avistou um barco maior no meio daquele mar de estrelas, ele remou até o barco na esperança de conseguir ajuda, mas o barco estava vazio, as estrelas refletindo na água, iluminavam a proa do barco com pequenos pontos brilhantes onde o nome do barco podia ser lido " Argo"
O pescador subiu na embarcação e engasgou ao perceber que os pontos luminosos que ele acreditava serem reflexos das estrelas na água, na verdade se estendiam pelo barco inteiro, era como se o barco fosse feito de estrelas.
Ele se lembrou da história dos argonautas, e sobre a constelação em forma de navio que recebeu o nome Argo em homenagem ao barco da lenda, ele olhou para os céus, mas não encontrou a constelação. Ela não estava mais no céus, ele também não conseguia identificar nenhuma constelação no céu, mesmo que conhecesse o céu noturno como a palma da sua mão.
Ele então observou o navio com cuidado e viu que olhando de certo angulo, os pontos luminosos do mastro formava a constelação de vela, ele não encontrou a constelação do antigo navio, pois ele estava no navio!
O pescador foi até a borda do navio e desceu até onde o seu velho barco estava e fazendo uma concha com as mãos ele pegou o pouco da água do mar, ela cintilavam como se pequenos diamantes estivessem flutuando em sua superfície, ele não estava mais no mar... Ele estava navegando nas estrelas.
O terceiro é sobre a sereia Lua, originalmente ela também seria uma peixe, porém prateado, mas a ideia de uma mulher cujo os cabelo envolviam seu rosto branco e redondo como a escuridão envolve a lua, era mais interessante. Apesar de não ser possível ver na foto, eu apliquei um pouco de maquiagem branca no rosto dela, dando um efeito levemente cintilante.
A sereia Lua
Ele olhou para a água espantado. Como aquilo era possível? Navegar no céu como se estivesse no mar...Havia sido o peixe? Inúmeras perguntas inundavam a sua mente, e entre elas, a mais importante: Como ele poderia voltar para casa?
Ele havia passado várias horas remando, ele até mesmo chegou a adormecer no barco, mas o amanhecer nunca chegava. Talvez o peixe pudesse leva-lo de volta, mas como encontrar um peixe que só pode ser encontrado ao por do sol, se o amanhecer nunca chegava?
Cansado e sem esperança, em um ataque de raiva ele estava prestes a jogar as escamas no mar quando notou algo brilhando na água, não era uma estrela, era maior e redondo, ele aproximou seu rosto da água e percebeu que a forma parecia crescer como se estivesse se aproximando cada vez mais, e quanto mais perto ela ficava mais clara a sua forma se tornava. Ele estava olhando para a lua.
Um rosto branco e brilhante emergiu das águas e se ergueu diante do pescador lhe causando uma mistura de medo e fascínio, seus cabelos eram tão azuis e repleto de estrelas como o mar que os cercavam, na verdade o próprio mar parecia uma extensão deles, como se o mar inteiro fizesse parte dele, eles escorriam e cobriam o seu corpo de forma que apenas o seu rosto era visível. Ela era bonita, mas ao mesmo tempo sua aparência provocava um medo sobrenatural.
Ela se inclinou em direção ao pescador e perguntou se ela poderia ficar com uma das escamas do peixe dourado em troca de uma de seus lagrimas. Ela fechou os olhos e uma única e perfeitamente redonda pérola escorreu pela sua bochecha caindo dentro do barco, a sereia estendeu a mão para pegar a escama, mas ele disse que uma pérola não seria o suficiente e perguntou à sereia se ela poderia ajudá-lo a voltar para casa.
A sereia lua, então tocou no navio de estrelas que imediatamente ajeitou seus mastros e abriu suas velas como se tivesse criado vida própria "Navegue nos ventos até que as estrelas se tornem nuvens, Zéfiro irá te guiar"
E por fim, a praia das nuvens, eu tive a ideia quando estava viajando de carro e vi várias nuvens que pareciam ondas do mar chegando na praia, eu tentei reproduzir esse efeito usando algodão, mas ele não ficava do jeito que eu queria, talvez eu devesse ter cortado o desenho e ter colado o algodão por trás... No fim eu acabei usando glitter. Video
A Praia das nuvens
Assim que o pescador estava dentro do navio as velas se abriram e navio começou a se mover em uma velocidade absurda. Com certa dificuldade, ele conseguiu entrar na parte interna para evitar ser jogado para fora do navio, ele olhou por uma das aberturas e viu o mar passar por eles como se o barco estivesse voando sobre as águas.
O barco continuou viajando por algumas horas até que finalmente diminuiu a velocidade permitindo que o pescador saísse. O movimento do barco agitou o originalmente calmo e sereno oceano criando ondas feitas de estrelas, conforme a viagem prosseguia, ele notou que as estrelas que iluminavam o mar, se tornavam a espuma quando as ondas se formavam até que em certo momento, elas deixaram de ser estrelas, e se tornaram nuvens, as nuvens envolveram o casco do navio conforme uma cor, completamente oposta ao profundo azul que o cercava, surgia no horizonte, colorindo tudo ao seu redor com tons dourados, o céu, a espuma, as águas e a areia abaixo delas.
Foi então que o pescador percebeu que já não estava mais no mar, e sim da sua cidade natal, ainda estava escuro, mas os primeiros raios de sol já podiam ser vistos.
Deixando o navio em um pequeno porto na praia, ele correu em direção a sua antiga casa, mas ao invés de uma cabana beira mar, ele se viu diante de uma taverna. Confuso e um pouco apreensivo, ele entrou no bar e pediu um copo de cerveja, a senhora no balcão anotou o pedido sem nem olhar para ele.
O bar estava bem cheio, sem ter uma mesa vaga ele se aproximou de um grupo de marinheiros bebendo e perguntou se poderia se sentar junto a eles, um dos homem lhe disse -Claro, mas com uma condição, nós estávamos contando histórias de marinheiros, e como todos nessa mesa já contaram alguma história, você terá que nos contar uma história sobre uma de suas aventuras em alto mar.
Ele se sentou junto a eles e lhes contou sobre sua aventura, sobre como ele quase havia capturado um peixe com escamas de ouro, sobre o Navio de estrelas Argo, e até mesmo sobre a praia cuja a espuma nas ondas era feita de nuvens, os marinheiros riram dizendo que era melhor ele parar de beber antes de ir para o mar, mas suas risadas foram interrompidas quando a senhora do balcão bateu a caneca de cerveja com força na frente do pescador.
-Seu pedido -Ela disse friamente.
Assim que ela voltou para o balcão, os outros marujos começaram a rir- Porra meu! Mas com tanta história pra você inventar, você foi contar justo a do peixe dourado na Taverna da Viúva?- Eles riram. Vendo a aparente confusão do pescador um deles explicou -Você não costuma vir muito para esse porto né? A viúva não gosta da lenda do peixe dourado. Desde que o marido dela desapareceu após um marinheiro contar sobre o tal peixe no bar, todos dizem que ele na verdade foi tentar pescar o tal "peixe do por do sol"
Incerto ele perguntou há quanto tempo o marido dela havia desaparecido - Há mais de 50 anos...
Ele olhou para a senhora que havia lhe servido a cerveja e a reconheceu, era a sua esposa, 50 anos mais velha, mas ele conseguia reconhece-la.
Ele foi até o balcão mas quando estava prestes a segurar suas mãos e lhe contar a verdade, ele viu que suas mãos estava ligeiramente transparentes, naquele momento ele soube que não poderia ficar.
Segurando a mão de sua esposa ele lhe entregou o pagamento pela cerveja, uma escama de ouro e uma perola branca como a lua, e disse -Eu sinto muito pelo seu marido -Ela ergueu o olhar cansado para o homem, e apenas teve um vislumbre de seu rosto antes dele sair pela porta do bar, mas foi o suficiente para que ela o reconhecesse.
Correndo para fora do bar, ela viu o homem misterioso entrar em um navio feito de estrelas que desapareceu assim que o amanhecer iluminou a praia deserta apagando qualquer estrela que ainda pudesse ser vista tanto no céu, quanto no mar