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Igrejas e conventos de Goa

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Igrejas e conventos de Goa 

Basilica do Bom Jesus

Critérios (vii)(ix)(x)
Referência 234 en fr es
País Índia
Coordenadas 15° 30′ 08″ N, 73° 54′ 42″ L
Histórico de inscrição
Inscrição 1986

Nome usado na lista do Património Mundial

Igrejas e conventos de Velha Goa é um conjunto de monumentos religiosos localizado em Velha Goa, no estado de Goa, Índia, declarado Património Mundial pela UNESCO em 1986.

Goa foi a antiga capital da Índia portuguesa e um centro de evangelização da Ásia a partir do século XVI. As justificativas de inclusão dos monumentos religiosos de Goa na lista de Património Mundial são[1]: 1) a influência dos monumentos na difusão de formas artísticas ocidentais — os estilos manuelino, maneirista e barroco — por toda a Ásia onde se estabeleceram missões católicas; 2) o valor do conjunto de monumentos de Goa como exemplo excepcional que ilustra o trabalho de evangelização e 3) o valor específico da presença na Basílica do Bom Jesus da tumba de Francisco Xavier, que ilustra um evento de importância mundial: a influência da religião católica na Ásia na Era Moderna.

A cidade de Velha Goa foi fundada no século XV pelos governantes muçulmanos do Sultanato de Bijapur como um porto nas margens do rio Mandovi. A povoação foi tomada em 1510 por Afonso de Albuquerque, primeiro vice-rei da Índia, com a ajuda do corsário Timoja, permanecendo quase continuamente sob domínio português até o século XX.

Igreja do Rosário, em estilo manuelino tardio, a mais antiga de Goa
São Francisco Xavier, o Apóstolo do Oriente

Missionários jesuítas, franciscanos e de outras ordens religiosas estabeleceram-se em Goa já no século XVI, utilizada como centro para a difusão do catolicismo na Índia. Os colonizadores foram inicialmente tolerantes ao hinduísmo e outras religiões, mas a partir de 1560 a difusão do catolicismo foi reforçada pela chegada da inquisição a Goa, muito temida em seu tempo[2]. Os séculos XVI e XVII foram a época áurea de Goa, que comandou um comércio florescente e chegou a ter privilégios administrativos semelhantes aos de Lisboa [3]. Nos dois primeiros séculos de presença portuguesa foram erguidas a maioria das igrejas e conventos que ainda hoje povoam a cidade, motivo de admiração dos viajantes que passavam por Goa[4][5]. Estes monumentos refletem o intercâmbio cultural entre portugueses e indianos: enquanto as formas arquitectónicas seguem os cânones europeus, a decoração interna de altares, retábulos, pinturas e mobiliário refletem a mão-de-obra dos artistas locais[4][5]. Isso foi possível pela grande tradição escultória dos artistas indianos da região de Goa, que não fizeram com que fosse necessária a importação a grande escala de mão-de-obra artística, como sim ocorreu no Brasil[6].

A partir de finais do século XVII, a concorrência comercial com holandeses e britânicos levou à decadência económica de Velha Goa, ao mesmo tempo em que o Brasil passou a ser a colónia mais importante para Portugal. Além disso, várias epidemias assolaram a cidade e o porto do rio Mandovi passou a ser inadequado para os navios mais modernos. O vice-rei mudou-se para Pangim (Nova Goa) em 1759, e Velha Goa perdeu o estatus de capital oficialmente em 1843[5].

Já no século XX, após vários anos de hostilidades e tratativas diplomáticas, tropas indianas invadiram e anexaram Goa e regiões circundantes à Índia, terminando séculos de presença portuguesa no sub-continente. A influência cultural, porém, continua até os dias de hoje e é evidente nos monumentos religiosos de Goa, declarados Património da Humanidade pela UNESCO em 1986.

Igreja de Nossa Senhora do Rosário

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A Igreja de Nossa Senhora do Rosário, construída em 1543, é a mais antiga das igrejas de Velha Goa ainda de pé. Inicialmente foi igreja paroquial, e depois colegiada. Por fora, a pequena igreja parece uma fortaleza; o pórtico de entrada flanqueado por pequenas torres cilíndricas com cúpulas é típica do gótico tardio e manuelino de Portugal, particularmente da região do Alentejo[5]. No interior, destacam-se as abóbadas manuelinas das capelas. Na capela-mor, além do retábulo dedicado a Nossa Senhora do Rosário, há na parede um cenotáfio de alabastro esculpido em estilo persa ou hindu, com a inscrição: "Aqui jaz Dona Catarina, mulher de Garcia de Sá, a qual pede a quem isto ler que peça misericórida a Deus para sua alma"[7]. No pavimento abaixo encontra-se a campa de Garcia de Sá (morto em 1549), sucessor de João de Castro como Governador da Índia[7][8].

Sé Catedral de Goa.

Sé Catedral de Goa

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Ver artigo principal: Sé de Santa Catarina

Goa foi elevada a sede de bispado em 1534 pelo Papa Paulo III, elevando-se a catedral uma igreja dedicada a Catarina de Alexandria construída nas primeiras décadas de colonização[7]. Esta pequena igreja, insuficiente para atender os fiéis, foi reconstruída a partir de 1562[5], durante o governo do vice-rei D. Francisco Coutinho. A construção foi extremamente lenta, uma vez que em 1619 apenas o corpo da igreja estava completo, faltando a fachada, terminada em 1631[7].

A Sé de Goa é o maior edifício construído pelos portugueses na Ásia, com 91 metros de comprimento e muito larga[5], o que provavelmente contribuiu à lentidão das obras[7]. A igreja é de três naves de igual altura, em forma de igreja-salão, como outras catedrais portuguesas da época como as Sés de Miranda do Douro (começada em 1552), Leiria (começada em 1559) e Portalegre (começada em 1556) [9]. A severa fachada, com três portais, possui uma só torre: a da direita foi destruída durante uma tempestade em 1766[5]. As naves da igreja são abobadadas e separadas por duas ordens de pilares. Da decoração interior destaca-se o magnífico retábulo da capela-mor em talha dourada.

Basílica do Bom Jesus

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Basílica do Bom Jesus
Ver artigo principal: Basílica do Bom Jesus

A Companhia de Jesus chegou a Goa em 1542, sendo sua figura mais relevante nestes primeiros tempos a de Francisco Xavier, considerado o Apóstolo do Oriente pelo seu trabalho na evangelização da Ásia. Algum tempo após sua chegada, os jesuítas criaram um centro educativo religioso, o Colégio de São Paulo ou de São Roque, que contava com uma enorme biblioteca e tipografia, mas este complexo foi destruído em 1830[10]. O grande monumento jesuítico que sobreviveu é a Basílica do Bom Jesus, começada em 1594 e sagrada em 1605, na qual trabalharam o engenheiro goês Júlio Simão e o jesuíta português Domingos Fernandes[10]. Seguindo o modelo[9] de igrejas jesuítas portuguesas como a Igreja do Espírito Santo de Évora e a Igreja de São Roque de Lisboa, Bom Jesus é um templo de nave única; esta é coberta por um forro curvo de madeira e não possui capelas laterais excepto por duas capelas na área do transepto. A fachada da igreja, obra de Domingos Fernandes, é de estilo maneirista e tem três portais e três andares compartimentalizados por cornijas; Sobre a fachada há um grande corpo cenográfico com frontão decorado por uma cartela com as armas da Companhia de Jesus e ladeado por volutas.

O maior tesouro do interior da igreja é a capela do transepto onde se encontram, desde 1655, os restos de Francisco Xavier, numa urna de prata finamente trabalhada por artistas locais. A urna está localizada num mausoléu executado pelo artista florentino Giovanni Battista Foggini em 1697. Este monumento, em mármore italiano, foi oferecido pelo Grão-Duque da Toscana, Cosme III de Médici, e armado no local por um artista especialmente enviado, Placido Francesco Ramponi, chegado a Goa em 1698 com esse objectivo[10]. Já a capela-mor possui um retábulo dourado, datado de c. 1699[11], dedicado ao Menino Jesus com uma imagem de Inácio de Loiola, o fundador da Ordem.

A Basílica do Bom Jesus de Goa foi classificada, em 2009, como uma das [[sete maravilhas de origem portuguesa no mundo.

Altar principal da Igreja de S. Francisco de Assis

Igreja de São Francisco de Assis

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A Ordem Franciscana foi a primeira a instalar-se em Goa, obtendo já em 1517 permissão do rei D. Manuel I para construir um convento. A primitiva igreja foi concluída em 1521 mas foi totalmente reedificada a partir de 1661, preservando-se porém um portal em estilo manuelino, incorporado à fachada maneirista da nova igreja. Este portal, em pedra escura, apresenta um perfil trilobado tipicamente manuelino e um remate ladeado por esferas armilares, símbolos de D. Manuel. A fachada é estreita e alta, com duas torres de secção octogonal. Em frente há um grande cruzeiro de granito[7].

O interior é de uma só nave abobadada, com capelas laterais e transepto, cobertos por estuque e pinturas[3][7]. O piso da igreja, como outras igrejas de Goa, possui grande quantidade de campas com inscrições e brasões. A capela-mor possui várias pinturas sobre a vida de São Francisco de Assis e um grande retábulo de talha dourada datado de c.1670[11] com uma imagem de Jesus na cruz abraçando com um braço a São Francisco. Atrás do retábulo, visível por uma abertura deste, encontra-se um tabernáculo esculpido, sustentado por estátuas dos Quatro Evangelistas, que era usado para exibir o Santíssimo Sacramento e o cibório[7].

Capela de Santa Catarina

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Capela de Santa Catarina
Ver artigo principal: Capela de Santa Catarina (Goa)

Em 1510, as tropas de Afonso de Albuquerque penetraram na cidade de Goa.[12] Uma capela foi erguida junto à porta da muralha de Goa muçulmana, por onde os portugueses invadiram.[12] Essa capela situava-se perto do local do Hospital Real, que se erguia a norte do Convento de São Francisco próximo do Arsenal.[12][13]

Trata-se de um edifício de planta retangular com nave única, apresentando a cabeceira quadrangular. A volumetria é simples e a fachada com três corpos separados por pilastras. O corpo central possui uma porta axial de verga reta, em pedra, com frontão triangular interrompido, encimado por uma janela ladeado por duas torres sineiras de secção quadrangular e cobertura em telhado de duas águas.[12][13] O interior da igreja é de uma só nave, sendo a capela-mor de pedra, com teto em forma cilíndrica de tonel, também em pedra.[13]

Ruínas da Igreja de Santo Agostinho

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Os Agostinianos chegaram a Goa ainda no século XVI, fundando um convento e construindo uma igreja a partir de 1597[9]. Atualmente, ambos estão em ruínas; a abóbada da igreja ruiu em 1842 e as fachadas caíram em 1936. Dos restos da igreja, o mais impressionante é uma parte de uma torre que ainda está de pé. Sabe-se que a fachada original era flanqueada por duas enormes torres de cinco andares, e o plano interno era de nave única com capelas laterais e transepto[5].

Igreja da Divina Providência

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Em 1639, religiosos da Ordem dos Teatinos chegaram a Goa para fundar um convento. Construíram uma igreja entre 1656 e 1661, dedicada a São Caetano e a Nossa Senhora da Divina Providência, desenhada pelos arquitetos italianos Carlo Ferrarini e Francesco Maria Milazzo com uma planta em forma de cruz grega[11]. A fachada, completada em 1661, imita a fachada de Carlo Maderno para a Basílica de São Pedro de Roma[5].

Referências

  1. Relatório da UNESCO sobre Goa
  2. Souza de Faria, Patrícia. Todos desterrados, & espalhados pelo mundo: a perseguição inquisitorial de judeus e de cristãos-novos na Índia Portuguesa (séculos XVI e XVII). Antíteses; Vol. 1, n. 2, jul./dez. 2008 [1][ligação inativa]
  3. a b Fernandes, Agnelo. Goa in the international trade (16th-17th centuries). in Essays in Goan history. Concept Publishing Company, 1989 ISBN 817022263X [2]
  4. a b Página do IGESPAR sobre as Igrejas de Goa
  5. a b c d e f g h i de Avezedo, Carlos. The Churches of Goa. Journal of the Society of Architectural Historians. XV, 3. 19. 1956. [3]
  6. Lameira, Francisco. Artistas que trabalharam para a Companhia de Jesus na concepção e na feitura de retábulos [4]
  7. a b c d e f g h Manoel José Gabriel Saldanha. História de Goa: (política e arqueológica). Asian Educational Services, 1990. ISBN 812060590X [5]
  8. Garcia de Sá no Dicionário Histórico de Portugal
  9. a b c Nunes Pereira, Nuno. Goan and Christian architecture of the 16th century. in Goa and Portugal: their cultural links. Concept Publishing Company, 1997 ISBN 8170226597 [6]
  10. a b c Dias, Pedro. A construção da casa professa da Companhia de Jesus em Goa. in Carlos Alberto Ferreira de Almeida: in memoriam. Faculdade de Letras da Universidade do Porto. [7]
  11. a b c Pereira, José. Goan architecture no sítio india-seminar.com
  12. a b c d «Património de Influência Portuguesa». por António Nunes Pereira 
  13. a b c «Bispo, A.A. "Ethos de Goa e tradição hospitalar. Santa Catarina de Alexandria e a vitória sobre uma filosofia de vida mercantil do Oriente". Revista Brasil-Europa: Correspondência Euro-Brasileira 131/11 (2011:3).» 

Ligações externas

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