30 de nov. de 2024

Sem título #3

Sábado é dia de andar por aí, mesmo depois de uma semana inteira mal dormida. Passei os últimos dias ansiosa e apreensiva, o que geralmente bagunça o meu ritmo. E, além desses últimos dias, outubro também foi um mês complicado e novembro seguiu no mesmo compasso. Mas aí o que estava me tirando o sono durante a semana se resolveu ontem, no penúltimo dia do mês, num desfecho que não é o fim, mas uma promessa  -- eu espero! -- de coisa boa, bonita e letrada. 

Então sábado é dia de andar por aí, feliz, na esperança que esse deleite dure e dure e dure e permaneça comigo por tempo o suficiente para que eu faça o que tenho que fazer e, quando eu ficar triste, que a lembrança desse estado de contentamento seja o suficiente para me encorajar.

Agora tudo é lindo: o casal de noivos saindo da igreja, o pombo aos pés de S. Sebastião, a banda tocando Bohemian Rhapsody, a senhora com um ventilador portátil na mão, o senhor sorrindo e me chamando de menina, a loja de CDs tão movimentada que é impossível andar sem pedir licença o tempo todo, a gringa se desenrolando em português mesmo eu sabendo inglês, a água de coco cara, esse tanto de árvores de Natal. E eu faço parte desse mundo e tenho tanto amor por ele que às vezes parece até impossível ser triste.

17 de nov. de 2024

I'm in the pleasure business

Não sou muito familiarizada com o trabalho do Anthony Bourdain, mas um tempo atrás li uma citação atribuída a ele e vira e volta me pego pensando nela:

"As a chef I'm not your dietician or your ethicist, I'm in the pleasure business."

Mas como é fácil atribuir qualquer fala a qualquer pessoa, fui em busca da fonte na esperança do Bourdain realmente ter falado isso. Primeiro cheguei até o Eater.com, que me mandou para o Grub Street. A frase em questão é sim do Bourdain (uhul!), e ela veio de um painel em que ele participou com os chefs Alice Waters e Duff Goldman em maio de 2009.

É uma pena que eu tenha encontrado somente trechos do painel; dá para perceber que tem certas falas em que os chefs fazem referências a coisas ditas anteriormente. Enfim, deixo aqui o vídeo que tem a citação em questão. Abaixo do corte está a transcrição das duas principais falas do Bourdain presentes nesse trecho, já que acredito que a segunda complementa a primeira, e a minha tradução. Caso alguém se interesse pela tradução do vídeo todo, é só avisar.


8 de nov. de 2024

O Quarto ao Lado (2024), dir. Pedro Almodóvar

Saí agora pouco de uma sessão de O Quarto ao Lado, do Almodóvar. A sessão não estava cheia -- também, é uma terça à noite -- e eu fui sem ver o trailer do filme, sabia só que se tratava de duas amigas de longa data que voltam a ter contato depois de anos separadas.

A trama revolve em torno de Ingrid (Julianne Moore) e Martha (Tilda Swinton): Martha, já debilitada devido a um câncer e com pouca perspectiva de melhora, e decidida a ter uma morte digna ao invés de definhar, pede a Ingrid para acompanhá-la durante seus dias finais. Juro que não quero ser chata, mas não consigo deixar de pensar que a ideia de Martha para sua morte não faz sentido. Por que a necessidade de estar acompanhada, se ela comete o ato quando Ingrid nem está em casa, no quarto ao lado? Por que deixar Ingrid nessa posição vulnerável de cúmplice? E, principalmente, sendo ela uma pessoa instruída e com recursos, por que não a Suíça?

Martha e Ingrid são personagens planas, e nada inferia que elas eram amigas além do fato que isso foi explicitamente dito logo no início. Moore e Swinton, surpreendentemente, apresentaram uma atuação engessada que destoa daquilo que elas são capazes de entregar. O diálogo, por sua vez, era forçado e pouco convincente, as personagens falavam o que sentiam, falavam o que estavam fazendo e discursam com pouquíssima naturalidade seus pontos de vista, deixando pouca abertura para qualquer tipo de sutileza. Li alguns comentários que sugeriam que isso é devido a um problema de tradução (é o primeiro filme em inglês do Almodóvar) e que talvez a coisa toda fosse soar melhor em espanhol, mas, francamente, acho que o diálogo que era fraco mesmo.

Durante o filme, foi impossível não lembrar do Antônio Cícero. Martha, já abalada pela doença, comenta a dificuldade de ler e escrever, de manter a concentração... Passei os dias que seguiram a morte do Antônio Cícero pensando demais nele e na questão do suicídio assistido, que é um assunto marcante para mim, então foi bizarro assistir um filme que se encaixa tão bem nessa discussão, mas que não faz jus ao tópico que retrata.

Como ponto positivo, posso dizer que a Tilda Swinton estava lindíssima e com um figurino impecável que eu fiquei invejando durante a maior parte do filme. A escolha dos tons de batom utilizados pela Julianne Moore também foi fantástica e me fez até pensar "eu deveria usar uns batons assim!", me esquecendo completamente que eles realçam minhas olheiras.

***

Escrevi esse post dia 05/11/2024, logo que saí do cinema mesmo. Engavetei ele por uns dias para ruminar e achar ele ruim, desistir de publicar, desistir de desistir e decidir publicar do jeito que estiver e pronto, tanto faz. Agora solto ele na natureza.

E deixo aqui a crítica da Isabela Boscov, que é muito mais articulada do que eu.

5 de nov. de 2024

Leitura de outubro (sim, no singular)

Gostaria de poder falar que esse mês minhas leituras não renderam porque estive ocupada com as leituras acadêmicas, ou porque estive atarefada com compromissos do trabalho. Talvez porque finalmente iniciei aquela aula de desenho que venho sonhando a tempos e agora passo todo o meu tempo livre rascunhando. Porque voltei a caminhar todo dia, porque comecei até a correr. Porque larguei tudo e fui fazer um mochilão pela América Latina, porque resolvi virar monge, porque estou apaixonada demais para ler... 

(O chato é que eu escrevi isso tentando ser engraçadinha, mas percebi que tudo isso depende só de mim, até as coisas que aumentei para fins cômicos -- para a tentativa de um fim cômico, pelo menos. Agora estou me sentindo menos engraçadinha. Bom, pelo menos sou self-aware... Que? A leitura de outubro? Ah é, claro, o motivo de eu ter iniciado esse post. Vamos lá.)

Comprei Paixão Simples, da Annie Ernaux, no início de outubro. O livreiro, quando me viu com ele na mão, recomendou muitíssimo a leitura e profetizou que eu iria iniciar e terminar no mesmo dia da compra -- é um livro curtinho, 61 páginas, então não foi uma façanha muito difícil. Paixão Simples, publicado inicialmente em 1991, vai tratar do caso que a autora viveu com um homem casado e mais novo. No fundo, o livro não é sobre o caso, nem sobre o homem e nem sobre a própria autora; no final da página 60, lemos: "Ele me disse 'você não vai escrever um livro sobre mim'. Ora, mas não escrevi um livro sobre ele, nem sobre mim mesma. Apenas expressei com palavras -- que talvez ele nem leia, e não são destinadas a ele -- o que a existência dele, por si só, me trouxe. Um tipo de dom reverso".

Está arriscadíssimo que Paixão Simples seja o melhor livro que li em 2024. Inclusive, estou doida para reler, o que quase fiz logo no dia seguinte que concluí a leitura pela primeira vez. Não estou escrevendo isso aqui para ser uma resenha, é só o post da leitura do mês (ou seja, é pra ser breve), mas essa leitura me deixou completamente embasbacada e eu recomendo demais da conta, mesmo. Ernaux tem uma escrita extremamente precisa, sem rodeios, mas com uma expressividade e alcance imensos. Foi realmente um livro delicioso de se ler.

A edição é da Editora Fósforo -- muito caprichada, papel Pólen Bold 90 g/m², com um projeto gráfico que também marca os outros livros da autora lançados pela casa, pra todo mundo ficar combinando na estante. A tradução é da Marília Garcia, que também traduziu outras obras da Ernaux.

Annie Ernaux ganhou o Nobel de Literatura em 2022 e eu só fui ler alguma coisa dela agora. Sendo assim, podemos supor que eu só vou colocar as mãos em um livro da Han Kang em 2026.

30 de out. de 2024

Sem título II

O final de outubro não tem sido lá muito bom. Tenho estado desanimada e apática e, à noite, chorosa. No último domingo acordei 12h com uma dúzia de ligações perdidas da minha mãe, preocupadíssima por eu não ter dado um sinal de vida já que, no mais tardar, acordo 8h. Passei o resto do dia molenga e de pijama, não saí de casa e não tive espírito para cuidar dos afazeres domésticos. A semana se iniciou assim, os dias passando de qualquer maneira, o trabalho acumulando, nenhuma leitura rendendo.

Nada demais aconteceu, nada fora do comum daquilo que já é rotina. Não quero me delongar desnecessariamente sobre minha vida pessoal (esse post inteiro já é desnecessário). Recentemente venho, mais do que me é normal, remoendo, ruminando, desejando coisas -- não coisas, mas vivências e experiências -- que muito provavelmente, é o que me parece agora, não vão se concretizar. Experiências que fazem parte da vida de tanta gente e que eu fico a observar do lado de fora, pela janela, incapaz de participar.

Ontem à noite me arrastei para o teatro. Não estava animada para ir, mas o ingresso já estava comprado e fazia um tempo que eu não via uma apresentação do conjunto de música em questão. No meio do espetáculo, durante uma canção de amor, talvez, notei a troca de olhares de dois dos músicos. Quanto mais acontecia, mais o pensamento se formava: serão eles um casal? Acompanho o conjunto faz um tempo e nunca tinha reparado. Eles se olhavam com frequência, sorrindo, e ela cantava as partes mais bonitas das canções para ele. Casal ou não, era um olhar terno, de cumplicidade e admiração, o tipo de coisa que existe tanto entre um casal de amantes quanto entre dois músicos experientes e apaixonados pelo o que fazem. Naquele instante, fiquei feliz de ser testemunha de um momento tão singelo. Segurei a risada e as lágrimas, aplaudi com os demais ouvintes, e saí de lá meio deslumbrada com esse negócio que a gente chama de vida.

Sigo olhando pela janela.

10 de out. de 2024

AGF

Essa semana recebi uma compra que fiz num sebo online. Veio tudo muito direitinho, e eles embrulharam meus livros numa folha do Suplemento Literário de Minas Gerais, cuja edição comemorava o centenário do poeta Alphonsus de Guimaraens Filho. Calhou que na folha vieram quatro poemas que eu até então desconhecia. Um deles, Balada dos moços dos tempos d'antanho (p.25 do suplemento), é grande demais para colocar nesse post, mas deixo aqui os outros três, já que não consegui escolher um só.

*** 

2 de out. de 2024

Leituras de agosto e setembro

Nos últimos meses tenho andado desleixada quando se trata de leituras. Para contornar essa situação decidi tentar voltar ao ritmo de pessoa-que-lê-nas-horas-vagas-ao-inves-de-ficar-olhando-para-uma-tela com umas leituras mais curtas, só pra me lembrar de como é ler um livro. Sendo assim, em agosto li

- Ideias para adiar o fim do mundo (Companhia das Letras, 2019) do Ailton Krenak. Do Krenak eu nunca tinha lido nada, então comecei pelo mais famoso, que coincidentemente era o que estava dando mosca no sebo. O Ideias... é a reunião das adaptações de duas palestras e uma entrevista; três textos, no total. Particularmente, acho que ouvir o Krenak palestrar deve ser mais cativante do que ler a palestra, mesmo que adaptada. Um texto que foi produzido para ser discursado para uma plateia geralmente não tem o mesmo efeito quando a gente lê na sala da nossa casa. Ainda assim, foi bom ler o Krenak e finalmente conhecer mais da pauta que ele defende.

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Já no início de setembro entrei de férias, o que significa que a leitura rendeu. Viajei, levei cinco livros comigo e consegui ler todos os cinco. Isso só confirmou minha suspeita de que talvez o ideal seja eu largar todos os meus compromissos e virar uma eremita que vive apenas de leitura. Comecei o mês com  

- O céu dos suicidas (Alfaguara, 2012), do Ricardo Lísias, autor que eu não conhecia. O livro foi comprado esse ano, o clássico vi num sebo, o título me chamou atenção, etc. A trama trata de um colecionador, há anos sem ter uma coleção, que deve lidar com o suicido de seu melhor amigo. É meio tosco resumir um livro em uma frase, mas é esse o acontecimento que desencadeia toda a narrativa. O livro tem capítulos bem curtinhos, que não ultrapassam duas páginas -- o que combina com um colecionador de selos e tampinhas de garrafa, miudezas -- e por conta disso a leitura flui bem rápido. Não foi uma leitura que me conquistou, confesso, mas gostei de conhecer a escrita do Lísias e espero ler outro livro dele no futuro. Depois li

- Bambino a Roma (Companhia das Letras, 2024), do queridíssimo Chico Buarque. Esse eu estava super animada para ler; é lançamento e também o segundo do Chico que leio esse ano. Bambino..., que traz na capa a indicação "FICÇÃO" logo abaixo do título, apresenta dois anos de uma infância em Roma que se constrói através da memória, do real e do imaginário. Não é de hoje que Chico faz esse jogo entre memória e esquecimento -- e, consequentemente, aí entra o imaginário, que completa as lacunas. Eu queria falar mais sobre esse livro (que eu gostei demais), mas, francamente, no momento me faltam palavras e esse post tem que sair logo. Desculpa, Chico!

- Auto-retrato e outras crônicas (Record, 1989), do Drummond. Ou melhor, finalizar a leitura. Eu tinha iniciado ele em abril (!!!), mas as circunstâncias da vida (leia-se desanimo total) me fizeram deixar ele de lado. A seleção das crônicas foi feita pelo Fernando Py, tendo como fontes a revista Leitura, o Correio da Manhã e o Jornal do Brasil. As crônicas, organizadas por ordem de publicação, abrangem os anos de 1943 até 1970, mas a maioria delas é da década de 60. Como todo bom cronista, Drummond compõe um delicado retrato daquilo que era o mundo na época, como no caso de "Ontem, em casa de Anibal...". Destaque para "Chuva no papel" e "Os dias escuros", que falam das chuvas no Rio de Janeiro (nada mudou); "Coração de moça", sobre transplante de órgãos; e "A Banda", que é exatamente sobre o que você está pensando.

- Dois irmãos, do Milton Hatoum (Companhia de Bolso, 2006). Não tenho muito o que falar desse aqui (desculpa) além de que estou satisfeita demais por ter lido um livro que parece que todo mundo leu menos eu. Gostei da leitura. Agora vou ir atrás da adaptação em quadrinhos dos irmãos Gabriel Bá e Fábio Moon.

- Pernoite (Martins Fontes/FUNARTE, 1989), do Antônio Maria. O Maria é um dos meus grandes queridinhos quando se trata de crônica (o outro é o Braga, claro). Esse foi um achado de sebo, e fiquei curiosa para ver se nele tinha crônicas que não entraram em Vento Vadio (Todavia, 2021), ótima antologia do Maria organizada pelo Guilherme Tauil. A resposta é sim, tem crônicas que não estão no outro livro (ou melhor, Vento Vadio traz novas crônicas que não estão em Pernoite), mas acho que por um bom motivo: Maria tem crônicas melhores do que essas. A proposta de Pernoite é trazer uma seleção das crônicas publicadas pelo Maria numa coluna de mesmo nome, mas, francamente, da seleção apresentada quase nenhuma se destaca. Se você quer conhecer o Antônio Maria, ou quer conhecer ele melhor, recomendo mesmo Vento Vadio, que é um trabalho muitíssimo cuidadoso do Tauil e uma excelente apresentação ao Maria (mas também dá para dar uma olhada nas crônicas dele no Portal da Crônica Brasileira). 

- Chico Buarque: Perfis do Rio, da Regina Zappa (Relume Dumará/RioArte, 1999). Foi engraçado ler esse aqui depois de Bambino a Roma, porque algumas informações e anedotas trazidas pela Zappa também foram utilizadas pelo Chico para o desenvolvimento da narrativa dele (a bicicleta cromada, a namoradinha do colégio...), então foi um surpresa agradável ir encontrando as semelhanças entre um e outro. O objetivo do livro em questão é realizar um perfil do Chico -- não é uma biografia! Gostei bastante do início do livro, das conversas da Zappa com o Chico, o relato dela de como é o backstage de um dos shows dele, os relatos das pessoas que trabalham com ele. Da metade para o final algumas partes vão ficando menos interessantes, particularmente os capítulos em que Zappa entrevista a Marieta Severo e as filhas do Chico. Um perfil é para ser algo pessoal, claro, mas nesses momentos tive a impressão de que muito da vida pessoal dele foi exposta (isso vindo de alguém que gosta de ler cartas e diários). Ainda assim, gostei de ler sobre o processo criativo do Chico, como ele trabalha, as anedotas da juventude dele.

***

Eu ia escrever um post só para a resenha de Bambino a Roma, mas descobri que deveria ter começado a escrever assim que terminei o livro (a ideia está mais fresca na cabeça) e não quase um mês depois (a ideia já começou a apodrecer). E também que não deveria ter lido a resenha do Odorico Leal antes, o que me deixou seriamente desmoralizada e descrente na minha capacidade de resenhista. Acabou que, no final das contas, nem um parágrafo saiu. Lições aprendidas: 1) escrever o quanto antes; 2) não ler a resenha dos outros antes de terminar de escrever. Bola pra frente.

Bom, esse foi o meu mês (agosto quase não conta). Só autores nacionais! Escrevendo esse post fui perceber que o único livro da lista que não é de segunda mão é o Bambino a Roma, já que é um lançamento. O resto é fruto dessa minha honrada labuta como rato de sebo.

4 de set. de 2024

Giselle mad scene

Giselle foi o primeiro ballet que eu assisti. Assisti duas vezes, primeiro no que provavelmente era um dos piores lugares da casa, no qual eu tinha uma visão melhor do fosso da orquestra do que do palco. Na apresentação seguinte, no mesmo teatro, fiquei num lugar melhor, com uma vista linda dos bailarinos.

Giselle, ao descobrir que seu amado Albrecht é, na verdade, um nobre já comprometido, morre de um coração partido. A cena da loucura de Giselle e sua subsequente morte foi, para mim, a mais marcante de toda a apresentação. Gosto de como ela solta os cabelos, de como ela brinca com a espada, e os camponeses ao fundo, tristes testemunhas.

 
Giselle, interpretada por Karen Kain, em 1976.

 
Giselle, interpretada por Natalia Osipova, em 2014.

22 de ago. de 2024

O diabo disfarçado de mulher

O primeiro computador lá de casa era um trambolho enorme feito de partes reaproveitadas de outros computadores. Ele ficava no quarto dos meus pais, num daqueles racks de compensado para computador com uma prateleira exclusiva para cada acessório imaginável. Já naquela época ele era um jovem deus em seu altar -- um jovem deus que usava um protetor de tela que eu sempre tirava quando meus pais não estavam olhando.

Uma internet decente demorou para chegar lá em casa, então, enquanto isso, eu gastava todo o meu tempo com jogos em CD-ROM. Eles eram vendidos junto com revistas em bancas de jornal, apesar de eu não ter uma lembrança sequer nem de qualquer uma dessas revistas, nem de ir na banca escolher um CD: até onde eu sabia, eles apareciam magicamente no porta CDs que a gente tinha (que, inclusive, foi um brinde de uma promoção de um posto de gasolina. Sim, quero ver quantas informações inúteis consigo colocar em um post só).

Um desses CDs era o 101 Dálmatas: Livro Animado Interativo (1999). O próprio nome já diz tudo e eu não tenho muito o que explicar aqui, mas ele era (é) um livro interativo que conta a história do filme, junto com alguns joguinhos e músicas. Alguns bons anos atrás, vira e volta eu me lembrava de uma das músicas e, apesar de me lembrar de parte da letra, nunca conseguia achar um vídeo com a canção. 

A música em questão era uma da Cruella de Vil. A parte dela que eu me lembrava com mais clareza é a que chamavam a Cruella de "o diabo disfarçado de mulher" o que, apesar do trocadilho do "de Vil" (sem internet, uma criança brasileira pode passar a vida inteira sem saber dessa, convenhamos) é bem ousado para um joguinho da Disney de 1999. Você se lembra daquela confusão que foi o comercial com os "pôneis malditos"? Aquilo foi em 2011, só para vias de comparação.

Alguns anos atrás minha busca acabou e finalmente encontrei a música, assim como todas as outras do CD e o gameplay completo. Eu cresci com ela então tenho total consciência de que sou meio suspeita para falar, mas gosto demais da (aparente) simplicidade dela e de como, em menos de um minuto, ela é capaz de apresentar o perfil de uma personagem de forma tão hábil:


 

Cruella de Vil, Cruella de Vil,
A coisa mais rara é vê-la gentil.
Ao vê-la sinto logo um arrepio.
Cruella, Cruella de Vil.
Ao vê-la, você pensa que é o diabo.
O diabo disfarçado de mulher.
Você vai confirmar, pois ela vai mostrar
que ataca como um animal qualquer.
É uma vampira, querendo sugar.
Deviam prendê-la e nunca soltar.
O mundo era bonito até que viu
Cruella, Cruella de Vil!

Também achei a versão original em inglês da música e, talvez seja a nostalgia falando mais alto, mas ela não é tão legal quanto a nossa versão brasileira. É uma pena eu não ter acesso ao nome dos tradutores ou até mesmo do estúdio de dublagem, que também fez um ótimo trabalho. A Disney sempre teve traduções muito boas, principalmente no que diz respeito às músicas (pelo menos a Disney de alguns anos atrás, eu não faço ideia de como eles estão recentemente). Música é um desafio para traduzir e, nesse caso, tem que ser levado em consideração não só os aspectos usuais da tradução de músicas, mas também a imagem da animação.

Para fechar o post, o vídeo da canção é parte do trabalho do Vinícius Garcia, que simplesmente tem um diretório fantástico dedicado à preservação de CD-ROMs infantis. A parte engraçada é que ele conta que iniciou esse projeto porque, em 2018, acordou "com uma enorme vontade de ouvir a música 'Há Muito Cão', do jogo 101 Dálmatas - Livro Animado Interativo".

13 de ago. de 2024

Sem título

Essa noite sonhei que estava na praia. Dava para sentir o cheiro das algas, o sol estava ardendo, a maré baixa, e era um dia perfeito para colocar a cadeira de praia bem onde a onda quebra, só para sentir o frescor da água...

É a segunda vez em menos de um mês que eu fico gripada; por natureza já sou meio miserável no frio, e estar num estado febril pelo terceiro dia seguido não ajuda em nada. Passei esses dias à base de vários cochilos, vendo o trabalho acumular e me perguntando se tem gente que se casa só pela comodidade de ter alguém que cuide dela num momento desses.

Na falta de um ser iluminado para se comiserar do meu estado moribundo (sem problemas), eu mesma me arrastei para cozinha para fazer o almoço e depois tive que arranjar coragem para colocar a mão na água fria e lavar a louça. O único momento em que meu nariz não fica entupido é quando estou de pé, só que ficar de pé não está numa classificação muito boa na lista de coisas que tenho energia para fazer.

Peguei o computador para finalizar um trabalho que é para hoje, comentar em uns blogs e escrever esse post aqui. Queria que estivesse sol, queria estar sentindo calor e, principalmente, queria estar vendo as ondas quebrando na praia.

28 de jul. de 2024

E nada como um tempo após um contratempo

Eu quero escrever, mas não sei o quê. Ontem, dia 27 (sábado!), celebramos três meses sem post novo no blog. Se não fosse pelo BEDA provavelmente seria mais, já que não postei as aquisições e leituras do mês de Abril. Acontece que desanimei com a minha própria proposta - às vezes é complicado soltar um parágrafo inteiro a respeito de um livro sobre o qual você não tem muito a dizer. E, para completar, de lá pra cá não li nada. Zero livros desde o início de Abril até agora.

De vez em quando isso acontece, isso de ficar um tempo sem ler, mas não sei se já fiquei tanto tempo sem abrir um livro. Quando isso acontece eu inevitavelmente me encontro num ciclo vicioso que é: não leio porque estou desanimada, fico mais desanimada ainda porque estou sem ler, não consigo pegar num livro porque estou desanimada porque não consigo ler, o desanimo aumenta porque... e por aí vai. 

Mas quero muito voltar a escrever aqui. O único post pessoal nesse blog é o que eu mais gostei de escrever, o que é engraçado porque quando comecei o blog eu tinha definido que ele não seria um diário, mas sim um espaço para escrever sobre literatura, filmes, e cultura em geral... enfim... acho que é possível encontrar um equilíbrio entre as duas coisas. Vamos ver.

Obrigada se você esteve aqui no blog durante essa minha ausência, e obrigada se você está lendo isso aqui agora. Para fechar, deixo aqui o link de um artigo delicioso de autoria do Alex Castro, para a revista Quatro Cinco Um, no qual ele apresenta o conceito de "Tsundoku", a arte de acumular livros. Eu posso não ter lido nos últimos meses, mas é claro que continuei comprando livros.

Até mais!

27 de abr. de 2024

[BEDA 2024] Tag 4 x 4

Ahh, a última postagem do BEDA. E não é que todos os posts saíram mesmo? Por último ficou a Tag 4X4, que é meio auto-explicativa, né.
 

20 de abr. de 2024

[BEDA 2024] Compartilhe apenas as notícias positivas da sua semana

- Vi duas tartarugas marinhas se alimentando na praia

- Vi um rapaz sair do carro para ajudar um pombo a atravessar a rua em segurança

- Vi um biguá mergulhar e pegar um peixe

- Iniciei um projeto de costura

- Terminei um projeto de costura

- Presenteei alguém

- Alguém gostou do presente

- Fui na minha praia favorita

- Olhei as ondas baterem nas pedras

- Comprei a jaqueta corta vento perfeita para caminhar no inverno

13 de abr. de 2024

[BEDA 2024] Meus looks favoritos do Tokyo Fashion

Não sei desde quando eu acompanho o Tokyo Fashion, mas ele esteve do meu lado durante várias fases do desenvolvimento do meu estilo pessoal. Ultimamente eu não tenho acompanhado com tanto afinco, mas vira e volta me lembro do blog e perco um tempo olhando as fotos. É divertido olhar o estilo dos outros e gosto bastante dos textos que eles escrevem com um pouquinho sobre o fotografado. Infelizmente, eles não atualizam o blog desde 2023, mas continuam ativos no Instagram. 

Uns dias atrás perdi mais um tempinho e selecionei alguns dos meus looks favoritos. Vamos lá:

6 de abr. de 2024

[BEDA 2024] Tirando a poeira da estante: os próximos livros que quero ler

Eu compro muitos livros, sim. Esse ano finalmente vou ficar sabendo o quanto. E quando eu comparar com a quantidade de livros que li, sei que vai ser vergonhoso. Eu gosto de boas traduções, boas edições. Bons sebos, bons preços... E acontece de, às vezes, algum livro ficar encalhado na estante de casa. Não acho que seja um grande problema. Se bem cuidado, um livro na estante pode durar bastante tempo, até. Os livros que compro geralmente são ligados a assuntos que já tenho interesse, ou autores que já conheço, ou autores que são influência de autores que já conheço... raramente compro coisas às cegas então, mesmo depois de anos pegando poeira, os livros que tenho continuam a me interessar. 

Achei legal fazer uma listinha de livros que estão na estante faz um tempo, mas que ainda tenho que ler. Seria bom ler todo mundo esse ano, vamos ver se consigo.

Norwegian Folk Tales, Peter Christen Asbjørnsen e Jørgen Moe. Um tempo atrás descobri o conto norueguês East of the Sun and West of the Moon, que geralmente é tratado como uma narrativa que formou-se através do mito de Cupido e Psiquê, um dos meus favoritos de todos os tempos. Além disso, eu cresci com o Literatura oral para a infância e a juventude, da Henriqueta Lisboa, que foi um livro que marcou bastante meus anos formativos. Achei uma boa conhecer mais sobre o folclore de outra gente, mas acabou que comprei ele e não li. Acho que foi no ano passado? Retrasado? Pelo o que sei, o Peter Christen Asbjørnsen é um dos grandes nomes quando se trata do folclore noruegês.

- Diários: 1909-1923, Franz Kafka. Esse eu comprei acho que logo quando foi lançado. É uma edição bem cuidadosa da Todavia. Acho que o diário do Kafka é um dos mais populares entre os diários de escritores, isso se ele não for o mais popular. Não tenho uma opinião 100% formada a respeito da discussão de se é ético ou não sair por aí publicando diários e outros escritos pessoais de gente que já se foi, mas acontece que eu acho tão divertido livros de correspondências ou diários...

- Chega de saudade: a história e as histórias da bossa nova, Ruy Castro. Sou fã demais do Ruy Castro, apesar de, por enquanto, ter lido pouca coisa dele. O Ruy tem uma escrita bem acessível e, apesar dos vários nomes que formam a história da bossa nova, os relatos que ele traz nunca ficam confusos. Em A onda que se ergueu do mar, um dos que eu li, ele conta sobre uma entrevista que ele fez com o Tom Jobim, logo após o Tom ter gravado com o Frank Sinatra... A inveja mata, gente... E, pelo o que vi, A onda que se ergueu do mar é tido como continuação de Chega de Saudade. Imagina ter entrevistado o Tom Jobim e deixar isso prum outro livro?

- A mulher calada: Sylvia Plath, Ted Hudges e os limites da biografia, Janet Malcolm. Esse eu comprei um milhão de anos atrás, antes mesmo de ter lido Sylvia Plath. A compra foi motivada, em geral, porque meu interesse em biografias se dá mais pelo processo de escrever uma do que pela biografia em si. Agora que eu finalmente li The Bell Jar já não tenho mais desculpa para enrolar mais ainda a leitura desse aqui.

- North & South, Elizabeth Gaskell. Eu já comentei brevemente sobre quando assisti North & South, adaptado pela BBC. Fiquei apaixonada, etc etc, e logo depois encontrei esse paperback super acessível ($) da Wordsworth Editions dando bobeira na Travessa. Um no-brainer, como dizem por aí. Eu cheguei a começar a ler durante uma viagem, mas não dei continuidade. Vou dar uma nova chance para ele, claro, porque na época que eu abandonei ele eu estava lendo pouco mesmo. Nunca li nada da Gaskell então, além do enredo da série, não faço muita ideia do que esperar.