victor’s review published on Letterboxd:
❝Eu preciso de você porque... eu me odeio.
Você é a única parte amável de mim❞
o tempo passa e o espelho se torna o nosso pior inimigo, não só ele, mas a sociedade também. O desespero toma conta e nos tornamos vítimas, cúmplices da alienação que provoca o desejo de perpetuarmos nossa melhor versão. Até que ponto isso pode chegar e qual a razão de nós mesmos nos conduzirmos para nossa própria desgraça? Esse é o questionamento que coordena a índole de A Substância a proporcionar uma experiência grotesca e dilacerante como nenhuma outra. Indiscutivelmente atroz, essa é uma obra que se compromete a se mantém firme em sua proposta até seus últimos minutos, o que o torna merecedor de estar no hall dos melhores deste ano.
Coralie Fargeot constrói através de seu body horror alucinante uma narrativa que possui como epicentro a questão da autoestima e que gira entorno do etarismo e do esvaziamento individual diante da pressão social a respeito da jovialidade e vitalidade de uma mulher no ramo da indústria. A cineasta modela um mundo opressor através de sua lente ultra angular que capta por meio dos close ups aquilo de mais desprezível em um ambiente controlado por homens com um desdém às mulheres mais velhas, o que é extremamente revoltante. A mídia e os ambientes reforçam a sensação de alienação e falta de controle, fazendo um levante reflexivo sobre como na vida contemporânea, nos submetemos voluntariamente a esses sistemas pela busca por gratificação imediata e a necessidade de validação, seja pela aparência ou pelo corpo, o que desperta um olhar crítico sobre essa tendência, questionando a até que ponto ainda temos controle sobre nós mesmos e o mais importante, até que ponto estamos dispostos a abrir mão desse controle para satisfazer as vontades externas.
a atmosfera é sufocante e a presença contínua do vício e do cotidiano nos estúdios coloridos com uma estética minimalista reforçam a sensação de frenesim e a ausência de austeridade, que ressalta a desumanização progressiva de duas mulheres que na verdade são uma só, dissolvendo assim a onipresença da substância que a torna tão interessante devido a sua uma ambiguidade de ser uma forma de aprimoramento interior ao passo que também se mostra uma ameaça, no que concerne as transformações físicas que além de perturbadoras também servem como uma metáfora para a transformação psicológica que as personagens sofrem. À medida que seus corpos e dna's mudam, eles perdem partes essenciais de sua humanidade e suas metamorfoses se tornam uma fusão entre alma e carne que geram um conflito deplorável. Demi Moore e Margareth Qualley entregam perfomances avassaladores enquanto cumprem seus papéis, e a sinergia entre as duas fornecem munição necessária para tornar esse filme tão grandioso.
em última análise, o cerne de A Substância provém de uma advertência, um aviso perturbador que reflete as consequências de abdicar da liberdade em nome do conforto, a questionar até que ponto estamos dispostos a abrir mão de nossa liberdade e de nossa humanidade em busca de um prisma pelo qual nos sentimos temporariamente bem, restando saber se um preço tão alto é de fato justificável.
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