"Sorriam!"

Um filme emocionante, intimista, detalhista, tocante, devastador e tenebrosamente realista.
A narrativa em si já é um relato verdadeiro, com nuances familiares intimistas, um meio de denúncia das vildades que subjugaram o Brasil por 21 anos: a ditadura militar no país. A baixeza do regime, sofrida por tantas famílias, é representada diretamente, destacando sobretudo o amiúde clima de apreensão e inquietação oriunda da incógnita diante da perseguição bárbara e sem fundamento racional e moral.
O figurino, o cenário, a ambientação e a forma com que se é narrado o enredo são ambamente compromissados com a fiél representação da verdade. As atuações se destacam o tempo inteiro, todo o elenco é quase que tangivelmente brilhante; as performances sobressaem-se em especial em instantes silenciosos e pacatos, nos quais mínimos detalhes e minuciosos ímpetos se fazem fatores determinantes da excepcionalidade contida no cativante Selton Mello como Rubens Paiva e na fenomenal Fernanda Torres como Eunice Paiva, além de todo o surpreendentemente habilidosíssimo elenco mirim, o qual retém e desenvolve plenamente seu potencial simples porém pesado; ademais, o breve e singelo olhar de Fernanda Montenegro é equilibrada com singularidade. A direção de Walter Salles conduz essencialmente com maestria, com sensibilidade fundamental em suas nuances.
Tive a abençoada oportunidade de assistir ao filme em sua segunda sessão de seu pré-lançamento no Brasil na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, e fico muito contente por isso; foi realmente um tocante espetáculo, não apenas pelo filme em si, mas por tudo aquilo que este simboliza. A experiência de se assistir a um filme essencialmente nacional (palpável, familiar, devidamente engraçado, íntimo, sublime, extraordinário, com um quê de pura originalidade nunca antes extraída em qualquer forma de expressão) em uma sala de cinema arrepia e transforma.
A mais sincera e profunda tentativa de expressão a respeito da experiência vivenciada hoje se faz praticamente inútil; faltam palavras para descrever com exatidão esse infinito momento, entretanto há a retenção de tal efemeridade única, e isso, em verdade, basta. A coletividade do público espectador como um só absorve e, antes, é absorvida por inteira pela obra cinematográfica.
Assistir à cena final e aos créditos finais enquanto se reflete sobre o vivenciado pela obra conduz à intensa lamentação, e ao ardente pranto.
A busca por esclarecimento na narrativa é movida tanto pelo temor quanto pela necessidade. A luta, ou melhor, a resistência contra a desumanidade da estúpida e autoritária ditadura é obviamente corajosa; a obstinação de Eunice Paiva sensibiliza integralmente, contrastando com a exposição da violenta repressão e da covarde censura por parte dos militares no poder.
O filme serve não "apenas" como forma de crítica e denúncia, mas transcende em forma de se refletir a respeito de um período sufocante causador de terríveis marcas e dolorosas cicatrizes mesmo atualmente.
Retrata-se tanto uma história pessoal quanto uma memória de panorama geral de toda a população brasileira que viveu e presenciou o cruel ataque à democracia, sendo tal singular para cada indivíduo espectador, além de atormentar ainda atualmente a sacralidade da soberania popular.

"Abaixo a ditadura!"