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Geografia tradicional

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A geografia tradicional é uma corrente da geografia que abrange desde as formulações do geógrafo Friedrich Ratzel até meados do século XX. O elemento de identidade mais importante dos geógrafos dessa tendência era a concepção de que a geografia consiste numa ciência de síntese ou ciência de contato entre as disciplinas que estudam a natureza e as da sociedade. Para realizar esse propósito integrador, os autores dessa corrente recorreram a um arsenal bastante eclético de ideias provenientes do positivismo, das “filosofias evolucionistas”, do romantismo e do netismo,[1] dando origem a três formas principais de pesquisa geográfica, que são:

O determinismo ambiental

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Nas duas primeiras propostas, o tema em destaque são as relações homem/natureza, enquanto a terceira, representada principalmente por Alfred Hettner e Richard Hartshorne, define as formas de integração entre elementos heterogêneos na crosta terrestre e sua variação espacial como objeto da geografia. Esta última subcorrente se destaca também por buscar conferir rigor conceitual e metodológico à geografia, de acordo com a ótica racionalista que foi se impondo nos meios científicos na primeira metade do século XX.[2] A geografia tradicional preocupava-se apenas com a natureza as velhas teorias veiculando sempre a ideia de expansão territorial como forma de poder, sem se preocupar com o lado social. Era de denominação da burguesia. Os geógrafos críticos tinham um conteúdo político a seguir, uma ideologia que era transformar a geografia tradicional, a rever seus conceitos em relação homem-natureza.

A geografia tradicional cedeu lugar a outras correntes quando se abandonou a ideia de que a contribuição original da geografia ao conhecimento científico estaria em ser uma ciência de síntese. Na segunda metade do século XX, com efeito, esse projeto foi substituído por outros, que, mesmo sem abandonarem totalmente o estudo das relações sociedade/natureza, passaram a se ocupar de novos objetos e a estudá-los com base em referenciais epistemológicos até então pouco valorizados pelos geógrafos. Na década de 1950, a geografia tradicional foi fortemente contestada pela geografia quantitativa, que se baseou no neopositivismo para redefinir o objeto e os métodos da geografia. Nas décadas de 1960 e, sobretudo, 1970, as concepções tradicionais foram contestadas também pela geografia humanista e pela geocrítica.

O Possibilismo:

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O possibilismo é uma corrente da geografia surgida no início do século XX, liderada pelo geógrafo francês Paul Vidal de La Blache[3][4], como uma resposta ao determinismo ambiental. Essa abordagem propunha que, embora o ambiente ofereça condições e limites naturais, as sociedades humanas possuem liberdade e criatividade para adaptar e modificar o espaço de acordo com suas necessidades e objetivos. Para o possibilismo, o meio natural apresenta uma gama de "possibilidades", mas são as escolhas culturais, econômicas e sociais das populações que determinam como ele será utilizado.

Diferentemente do determinismo, que atribuía às condições ambientais um papel central e inquestionável na formação das sociedades, o possibilismo enfatiza o papel ativo dos seres humanos no processo de construção espacial. Exemplos dessa interação incluem o uso de tecnologias para superar barreiras ambientais, como sistemas de irrigação em regiões áridas ou o cultivo em terraços em áreas montanhosas. O conceito possibilista também influenciou o desenvolvimento da geografia regional, que analisa as peculiaridades das relações entre sociedade e natureza em diferentes espaços.

Apesar de sua relevância histórica, o possibilismo foi criticado por sua abordagem descritiva e pela falta de questionamentos sociais mais profundos. Ele não analisava criticamente as desigualdades ou as estruturas de poder que moldam as escolhas humanas, mantendo uma postura considerada neutra. No entanto, sua contribuição para superar a visão determinista e abrir caminho para novas abordagens foi fundamental, influenciando correntes posteriores, como a geografia humanista e cultural, que continuaram a explorar a complexidade das interações entre sociedade e natureza.

Geografia como ciência da diferenciação de áreas

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A geografia como ciência da diferenciação de áreas é uma abordagem que surgiu no início do século XX, principalmente sob a influência dos geógrafos Alfred Hettner e Richard Hartshorne. Essa corrente se concentrou na análise das variações espaciais e na busca por entender como diferentes elementos naturais e humanos se distribuem e se relacionam de forma desigual na superfície terrestre. Em vez de buscar explicações para as relações entre homem e natureza de maneira geral, essa perspectiva geográfica enfoca as particularidades de cada região, destacando suas características únicas, como o clima, o relevo, a cultura e a organização econômica, e como esses fatores se combinam para criar espaços geograficamente distintos.

A principal contribuição dessa abordagem foi a ideia de que o espaço geográfico é marcado por diferenças e não por uniformidade. Cada região possui uma identidade própria, resultado da interação complexa entre fatores naturais e humanos. Para Hettner e Hartshorne, o objetivo da geografia seria entender e categorizar essas diferenças, analisando como o espaço se organiza e como as várias características (sociais, culturais, econômicas e ambientais) formam áreas distintas. Esse conceito desafiava a ideia de que a geografia deveria ser uma ciência de síntese ou uma ciência integradora, focando mais na diferenciação regional.

Essa visão de geografia também visava conferir maior rigor metodológico à disciplina, adotando uma abordagem mais formal e sistemática na análise das regiões e seus elementos. A geografia como ciência da diferenciação de áreas incentivou o uso de métodos mais precisos para estudar a organização do espaço e suas variações, como a cartografia detalhada e as análises estatísticas. Embora essa corrente tenha sido gradualmente superada por outras abordagens críticas e mais voltadas para as questões sociais e políticas, sua contribuição para o desenvolvimento da geografia como uma ciência rigorosa e mais especializada na análise regional permanece importante.

Críticas à geografia tradicional:

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Na segunda metade do século XX, a geografia tradicional perdeu espaço para novas abordagens que redefiniram o objeto e os métodos da disciplina.

  • Geografia quantitativa (década de 1950):
    • Inspirada no neopositivismo, enfatizou o uso de métodos matemáticos e estatísticos para estudar os fenômenos espaciais.
  • Geografia humanista e geocrítica (décadas de 1960 e 1970):
    • Contestaram a neutralidade científica da geografia tradicional.
    • Introduziram enfoques mais subjetivos, sociais e críticos, analisando as relações de poder, a organização espacial e a subjetividade das experiências humanas no espaço.

Essas novas correntes trouxeram um caráter mais crítico e interdisciplinar à geografia, destacando questões sociais, culturais e políticas e transformando a disciplina em um campo mais diverso e dinâmico.

Referências

  1. Paulo César da Costa Gomes. Geografia e modernidade. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003
  2. Luis Lopes Diniz Filho. Fundamentos epistemológicos da geografia. Curitiba: Editora IBPEX, 2009 (Coleção Metodologia do Ensino de História e Geografia, 6)
  3. LA BLACHE, Vidal de (1954). Princípios de Geografia Humana. (PDF). Lisboa, Portugal: Cosmos 
  4. «PAUL VIDAL DE LA BLACHE E SUA CONTRIBUIÇÃO NO PENSAMENTO GEOGRÁFICO.» (PDF). CGB. Anais do Congresso Brasileiro de Geografia. Agosto de 2014. Consultado em 2 de janeiro de 2024  line feed character character in |título= at position 57 (ajuda)